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  TEMA: DISCURSO NA SOLENIDADE EM LORENA,

1ª CAMINHADA CONSTITUCIONALISTA 9 DE JULHO

Devido a sua grande importância e com autorização de seu autor, é apresentado a seguir o discurso feito pelo Cel. Wanderley Gomes Sardinha, militar aposentado e escritor, de Lorena, SP, discurso proferido por ele na solenidade realizada na praça Arnolfo de Azevedo, em Lorena, na manhã do dia 7 de julho de 2006, solenidade em comemoração ao 9 de julho com a passagem por Lorena dos componentes da 1ª Caminhada 9 de Julho, caminhada de 825 quilômetros de amor a São Paulo iniciada na cidade de Santa Fé do Sul, SP e com encerramento na cidade de Cruzeiro, SP, dia 9 de julho. Como diz o folheto distribuído pelos integrantes dessa caminhada: "Em 1932 São Paulo lutou pela Democracia. Em 2006 São Paulo caminha pela cidadania. Estamos caminhando para resgatar a data máxima do Estado de São Paulo. Em 1932, exatamente no dia 9 de julho, São Paulo foi á luta pela democracia. Naquela batalha, fermentada pelo espírito cívico do povo paulista, descendentes dos heroicos bandeirantes, registramos a mais linda página de nossa história, levantando a bandeira da liberdade e clamando por uma Constituição justa e soberba. São Paulo deflagrou o 9 de Julho pensando no Brasil, exatamente como os bandeirantes consolidaram as fronteiras de nossa Pátria. São Paulo terá, para sempre, o crédito dos brasileiros que entenderam nossa coragem cívica diante das instituições democráticas ameaçadas.

 
       

"Digníssimas autoridades e Integrantes da 1ª Caminhada Constitucionalista

Acabais de adentrar, nos dias de ontem e hoje, os sítios históricos da Heróica Revolução de 1932 no Vale do Paraíba. São os lugares onde lutaram e pereceram nossos bravos heróis e se estenderam de Queluz a Guaratinguetá.

Diziam os gregos quando pisavam o solo onde se havia travado uma batalha: - " Façamos silêncio para que não acordemos os que aqui morreram, pois seus espíritos aqui se encontram em sono eterno".  Assim, heróicos caminhantes constitucionalistas que aqui se reúnem: - Façamos silêncio, a partir de agora porque o solo que iremos pisar foi palmilhado pelos nossos heróis e os seus espíritos aqui se encontram. É preciso não acordá-los porque eles dormem o sono da glória.

Comecemos a nossa caminhada em direção ao campo de luta. Percorramos nossas trilhas e caminhos com o pensamento em nossos bravos. lembremos de suas aflições, seus sofrimentos, suas angústias, mas tudo superado por uma ânsia incontida na vitória que seria obtida na luta cruenta ou fora dela.

Quando cruzarmos os portais do heróico Regimento Itororó, evoquemos os nossos bravos que dali partiram, rememoremos os nossos mortos e rezemos por suas almas. Em Canas, quando passarmos pela Chácara do Marton, façamos a "Oração ante à última trincheira" (de Guilherme de Almeida), pois ali se travou o derradeiro combate da Revolução no Vale do Paraíba. Lá estão, ainda hoje, abertas, as posições onde caíram nossos heróis. Mais um pouco à frente e passaremos por Cachoeira Paulista, onde dezenas de heróis combatentes deram suas vidas por São Paulo, para que tivéssemos de volta nossa Constituição e os direitos que nos foram usurpados.

E assim, alcançaremos Cruzeiro, fim dessa jornada histórica, onde selou-se o Armistício. Que pena que não cheguemos até Queluz para que todo o caminho pisado pelas botas dos nossos bravos, seja percorrido. Para que pudéssemos ouvir, no silêncio dos grotões, o canto do vento e, nele, o gemido dos que ali combateram, quando lutaram pela nossa honra, pela nossa integridade e pela defesa de nossos sagrado solo bandeirante.

Envoquemos, em rápidas palavras, aqueles dias tormentosos vividos pela nação, após a Revolução de 1930. Era a época do nascimento das ditaduras européias e o presidente Getulio Vargas sonhava ser um ditador. Para tanto fez com que nossas garantias constitucionais fossem abolidas e o Estado de Direito, amordaçado. O bravo povo paulista, herdeiro dos heróicos homens de Piratininga não aceitou aquele estado de coisas. O maior e mais rico Estado da União passou a ser vilipendiado e ultrajado no que possuía de mais caro: a honra de seu povo.  Não podia mais escolher seus dirigentes que passaram a ser nomeados pelo governo federal. Uma grande central de inteligência do governo da República, sob a máscara de partido político revolucionário, fora instalado na capital paulista, com a finalidade de vigiar os passos da gente de nossa terra. O povo de São Paulo pediu insistentemente ao chefe da nação que lhe fossem restituídas as garantias dadas pela Constituição e que o país voltasse ao Estado de Direito. Mas, tudo foi em vão e São Paulo se viu obrigado a partir para o campo de luta, para defender a honra de sua gente. E, assim, marchou para a guerra em 9 de julho de 1932.

O Exército Constitucionalista tinha como núcleo formador a 2ª Divisão de Infantaria, sediada na capital paulista. Era constituída pelas unidades do Exército aquarteladas no Estado, a gloriosa Força Pública de São Paulo (atual Polícia Militar) e os Batalhões Patrióticos, formados com os jovens estudantes de nossas Universidades. Como tropa de fora do Estado, contávamos com o 5º Regimento de Cavalaria Divisionária, de Castro, Paraná e com a 1ª Companhia do 12º Regimento de Infantaria de Belo Horizonte, MG. Totalizava 40 mil homens, verdadeiros gigantes, homens da têmpera do aço. O armamento individual era moderno: 36 mil fuzis alemães Mausir, a artilharia era Krupp e Schneider, de calibre 75, 105 e 240 milímetros. O "inimigo" tinha um efetivo imenso, todas as divisões de infantaria existentes no país, as polícias militares de todos os Estados de federação, toda a Marinha de Guerra, cerca de 400 mil homens. Mas, a determinação e a vontade de lutar da gente paulista, essa não tinha limites, era infinita, era inquebrantável.

O Exército Paulista fora organizado em quatro grandes destacamentos. O maior de todos, o do Vale do Paraíba, que se subdividiu em 2: o Andrade, que seguiu para Queluz e o Paiva Sampaio, para o túnel da Mantiqueira. Para Piquete seguiu o Destacamento Abílio de Resende, para a fronteira paranaense, o Brazílio Taborda e para a divisa com Minas Gerais, o Romão Gomes. Foi organizado ainda, um grupamento que seguiu para Cunha com a finalidade de impedir o avanço dos fuzileiros navais do Getúlio, vindo de Parati.

Essa gente fantástica, herdeira dos heróicos bandeirantes paulistas de outrora, se bateu de forma tão vigorosa, denodada e altaneira, que o todo poderoso Exército inimigo, empurrava-a com grande sacrifício. Na frente paranaense, 2 divisões inimigas pouco faziam contra os valorosos paulistas da gloriosa Força Pública do Estado de São Paulo. Na frente mineira, Romão Gomes era um gigante, em face de uma divisão inimiga. No Vale do Paraíba, os 50 mil homens de Góis Monteiro lutavam com enorme dificuldade para movimentar muito pouco os estóicos combatentes de São Paulo. Em Piquete e e no túnel da Mantiqueira, em Cruzeiro, a frente ficou estacionária até o início da 3ª semana de setembro, só retraindo com o recuo do destacamento do Vale do Paraíba.

Isolado por terra, mar e ar, sem poder receber ajuda externa, com pouca munição para fuzil e sem trotil para os canhões, a situação paulista era precária na metade do mês de setembro de 1932. Mas a guerra continuava e tudo era superado por uma barreira incontida, uma cega confiança na vitória e um desejo ardente de ver triunfar os ideais constitucionalistas.

O grande retraimento feito pelo coronel Andrade na noite de 12 de setembro, da frente de Silveiras para Cachoeira Paulista, obrigou as tropas do túnel da Mantiqueira, de Piquete e de Cunha, a retraírem para Guaratinguetá. Decidiu o coronel Andrade a oferecer mais 3 combates ao inimigo, dois em Cachoeira e outro em Canas, antes de seguir para as grandes trincheiras de Engenheiro Neiva. Assim, combateu-se em Cachoeira nos dias 14 e 15 de setembro e no dia 16, em Canas. Foi o último combate no Vale do Paraíba.

No dia 15 de setembro de 1932, a Fábrica de Pólvora de Piquete que produzia toda a pólvora e os demais explosivos para o Exército Constitucionalista, caiu em poder da ditadura. Era o prenúncio do fim da contenda. O Exército Paulista ocupou com cerca de 10 mil homens a grande trincheira de Engenheiro Neiva, de 22 quilômetros de extensão, feita pela população civil de Guaratinguetá e aí esperou o inimigo para oferecer-lhe combate. Já quase sem munição para fuzil, aguardou-se a chegada dos ditatoriais para um combate corpo a corpo, à baioneta. Mas o presidente Getulio Vargas, temendo uma grande mortandade, determinou ao general Góis Monteiro que não aceitasse o combate de Guaratinguetá e informou ao governo paulista que a partir do dia 27 de setembro não seria mais disparado nenhum tiro naquela guerra.

Começava, assim, uma longa discussão para se definir as laudas do Armistício, que veio a ser assinado, em seguida, na cidade de Cruzeiro. Findava, desta forma, o maior e mais sangrento conflito, travado em território pátrio. São Paulo, se por um lado não venceu no campo de luta, por outro recuperou o estado de Direito com a promulgação da Constituição de 1934.

Caros integrantes da 1ª Caravana Constitucionalista. Ide a Cruzeiro e festejai os feitos dos nossos heróis. São páginas brilhantes, só comparadas à epopeia gigantesca dos bandeirantes que levaram a fronteira da Pátria para muito além da linha de Tordesilhas. Dizei à gente cruzeirense que os 40 milhões de paulistas gostariam de lá estar nesta data, mas estaremos em espírito, orando pelas almas de nossos bravos e pedindo a Deus que os tenha e os guarde no seu reino de luz.

Cel. Wanderley Gomes Sardinha.

Lorena 7 de julho de 2006"